- Olhei o relógio: 23h05- tinha mais do que tempo.
- Comecei a cravar as unhas na carne quente do peito e puxei a pele com firmeza até fazer uma enorme abertura.
- O ar invadia-me e desvendava o meu vazio.
- Porque estaria eu a remexer o meu interior?
- Estava tão abalada por tudo, tão revoltada comigo mesma!
- Sentia-me inútil, débil, destroçada...
- Apetecia-me pegar nos pormenores fracassados da vida e rasga-los em pedacinhos, como fazemos aos rascunhos dos desenhos inúteis.
- Depois, pensei que seriam esses rascunhos idiotas, esses pedaços de vida fracassados, que estariam cá para falar da minha evolução, da minha vitória.
- E o golpe continuava a permitir a passagem do ar.
- E as lágrimas ardentes começavam a rasgar-me a face. Doía muito, muito mesmo.
- As unhas permaneciam cravadas a exercer pressão, mas tinha sido eu a rasgar a minha própria carne, com ou sem fundamento.
- No entretanto, olhei o interior do peito e vi a minha pequena luz, o meu pequeno valor, a minha pequena esperança.
- Foi o suficiente para a ferida fechar.